Yakye Axa: a Corte IDH realizou uma visita de supervisão para cumprimento de sentença
- Quase 20 anos após a sentença, a comunidade ainda não tem acesso à água potável, saúde, educação e alimentos de qualidade.
- Na audiência privada que ocorreu após a visita, foram expressas as principais preocupações e reivindicações da comunidade.
Asunción, Paraguai, 20 de setembro de 2024. – Uma delegação da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), liderada pelo Vice-Presidente Rodrigo Mudrovitsch, visitou o Paraguai para realizar uma inspeção relacionada às medidas de reparação no caso da comunidade indígena Yakye Axa vs. Paraguai. Também participaram integrantes do Centro para a Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e da Tierraviva aos Povos Indígenas do Chaco paraguaio, organizações que atuam como representantes convencionais perante a Corte Interamericana, além de uma comitiva de mais de 70 pessoas de diversos órgãos do Estado responsáveis pela execução das medidas de reparação. Esta é a segunda vez que a Corte visita a comunidade desde que emitiu sua sentença em 2005.
Comparando com a primeira visita realizada em 2017, foram observados alguns progressos no cumprimento das medidas de reparação determinadas, no entanto, ainda há muito a ser feito. Apesar do avanço significativo na construção da estrada, ela ainda apresenta vários problemas, como a falta de manutenção dos primeiros 10 quilômetros, sinalização adequada, guardrails e iluminação, tornando-a perigosa para o tráfego. Além disso, a estrada não está asfaltada, o que significa que o tráfego de veículos e as condições climáticas podem causar danos que exigem manutenção constante.
Por outro lado, a comunidade não tem garantidos bens e serviços básicos, como acesso à saúde, educação, alimentos de qualidade e água potável, o que gera obstáculos para sua subsistência. A comunidade não possui independência hídrica e depende da água fornecida pelo Estado, que não é suficiente para toda a população. Por esse motivo, precisam coletar água da chuva em tanques que não possuem as condições sanitárias adequadas. Em relação às moradias, houve progresso na construção, mas foram feitas com materiais de baixa qualidade, apresentando fissuras nas paredes e goteiras no telhado. Além disso, as construções foram realizadas sem banheiros e áreas de banho. Ao mesmo tempo, o fornecimento de alimentos em quantidade, variedade e qualidade suficientes continua sem garantia.
Quanto ao acesso à saúde e educação, a construção do consultório médico ainda não foi concluída, e não se sabe qual equipe estará disponível. Em relação à educação, passaram-se cinco anos desde que a comunidade se estabeleceu em suas terras e, no entanto, a sala de aula móvel que utilizavam permanece ao lado da estrada. As duas salas onde atualmente ocorrem as aulas foram erguidas com um fundo de emergência educativa fornecido pelo Ministério da Educação e Ciências (MEC) e não possuem banheiros disponíveis para as 64 crianças da comunidade que frequentam as aulas.
Por fim, destacamos que as obras para fornecer eletricidade à comunidade estão paralisadas. Apesar de as colunas já terem sido instaladas, ainda não foram colocados os cabos ou transformadores necessários, de modo que a comunidade não conta com serviço elétrico que chegue a todas as moradias.
Após a visita, foi realizada uma audiência privada na qual foi ressaltada a falta de avanços na titulação das terras em nome da comunidade e na adoção de medidas legislativas e outras ações para garantir o direito à propriedade dos povos indígenas.
Durante esta visita ao terreno e na audiência, o Vice-Presidente e a Secretaria da Corte tiveram a oportunidade de ouvir diretamente os líderes da comunidade Yakye Axa, ouvir suas reivindicações e ver as condições em que se encontram. Esperamos que, após esta nova visita, o Estado finalmente adote todas as medidas necessárias para cumprir totalmente a sentença.
Antecedentes do caso
A comunidade, composta por mais de 300 pessoas do povo Enxet, está localizada no Departamento de Presidente Hayes. Devido à expansão da agricultura e da pecuária, uma grande extensão de suas terras foi vendida pelo Estado paraguaio, sem seu consentimento, forçando a comunidade a se deslocar e perder o acesso aos seus recursos naturais tradicionais. Em 1993, a comunidade iniciou os trâmites para a reivindicação das terras que considera seu habitat tradicional. No entanto, essas tentativas não tiveram resultados positivos.
O caso Yakye Axa foi litigado pelo CEJIL e pela organização Tierraviva, que conseguiram uma sentença em 2005. A Corte condenou o Estado paraguaio pela violação dos direitos à propriedade coletiva de suas terras, à vida, às garantias judiciais e à proteção judicial, e ordenou uma série de medidas de reparação, incluindo a devolução das terras à comunidade. No entanto, quase 20 anos após a sentença, o Estado paraguaio ainda não cumpriu a totalidade dessas medidas, demonstrando uma demora significativa na resposta estatal.