
CEJIL destaca legado autoritário e ausência de justiça para vítimas da ditadura durante visita do Relator Especial da ONU ao Brasil
- CEJIL participou ativamente da visita do Relator Especial da ONU sobre verdade, justiça, reparação e garantias de não repetição, contribuindo com sua experiência no litígio internacional.
- A organização reforçou a urgência do cumprimento das sentenças da Corte Interamericana e da adoção de uma justiça de transição com perspectiva racial e histórica no Brasil.
Rio de Janeiro. 10 de abril de 2025. – Durante a visita oficial ao Brasil do Relator Especial das Nações Unidas sobre verdade, justiça, reparação e garantias de não repetição, Bernard Duhaime, o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) teve uma participação ativa. Com mais de 30 anos de atuação estratégica na defesa dos direitos humanos, CEJIL contribuiu com insumos fundamentais sobre casos litigados no Sistema Interamericano do Direitos Humanos que revelam um legado autoritário, a persistência da impunidade pelas graves violações cometidas durante a ditadura civil-empresarial-militar no país e a insuficiência das medidas de verdade e reparação.
O propósito da visita do Relator foi avaliar as medidas nos âmbitos da verdade, da justiça, da reparação, da memória e das garantias de não repetição adotadas pelas autoridades no Brasil para enfrentar as graves violações de direitos humanos cometidas pelo Estado durante a ditadura (1964-1985).
“Embora o Brasil tenha feito avanços significativos para lidar com essas questões desde 1985, a insuficiente implementação de políticas de justiça de transição para enfrentar as consequências da ditadura infelizmente tem levado a recorrentes ataques à democracia, aos direitos humanos e ao Estado de Direito”, afirmou o Relator em uma declaração ao finalizar sua visita.
A visita do Relator ocorreu em um momento político crucial, marcado pelos 61 anos do golpe civil-empresarial-militar. Em uma reunião com o Relator, o CEJIL destacou a falta de cumprimento das medidas determinadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) nos casos Gomes Lund (conhecido como Guerrilha do Araguaia) e Herzog, além do cenário contínuo de violência de Estado que impacta especialmente comunidades negras, indígenas e camponesas. A ausência de justiça e de políticas eficazes de memória e reparação mantém feridas abertas e compromete a construção democrática.
CEJIL alertou para o risco da impunidade se consolidar de forma definitiva, diante da morte de possíveis responsáveis, testemunhas e familiares que ainda aguardam respostas. Reforçou ainda que a manutenção da Lei de Anistia como obstáculo à responsabilização penal é incompatível com a Convenção Americana de Direitos Humanos, como já decidido pela Corte Interamericana. O silêncio institucional sobre os crimes da ditadura não apenas perpetua a dor das vítimas, mas mina os alicerces do Estado Democrático de Direito.
A organização também enfatizou a importância de incorporar uma perspectiva racial à justiça de transição, ressaltando que as práticas repressivas do regime militar se basearam e atualizaram formas de violência historicamente dirigidas à população negra e indígena. Ainda, reforçamos que a compreensão da continuidade dessa violência — do colonialismo à ditadura, até os dias atuais — é essencial para garantir que as medidas de não repetição sejam eficazes e transformadoras.
Durante a visita, CEJIL apresentou evidências concretas sobre o descumprimento sistemático das decisões internacionais pelo Estado brasileiro, como no caso da Favela Nova Brasília e dos crimes no campo, evidenciando que as práticas autoritárias persistem sob novas roupagens. Além disso, reiterou a necessidade de políticas de reparação que levem em conta as raízes escravistas e coloniais do autoritarismo no Brasil.
No CEJIL reafirmamos nosso compromisso com a promoção de uma justiça de transição efetiva, com memória, verdade, reparação e não repetição — construída a partir da escuta das vítimas e com foco na transformação estrutural da sociedade brasileira.